Décima nona edição do FIB reuniu 50 mil expectadores com atrações de 11 estados em diversas áreas da cultura e cidadania
Campo Grande (MS) – A 19ª edição do Festival de Inverno de Bonito (FIB) contou com 106 atrações artísticas, sendo 83 convidados do próprio Mato Grosso do Sul e 23 de outros 10 estados brasileiros (Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Bahia, Goiás, Pernambuco e Maranhão). Com uma programação diária gratuita de mais de 17 horas, o FIB 2018 atraiu 50 mil expectadores (em 2017, foram 38 mil) e transformou os vários locais que receberam o evento em Bonito em uma grande celebração da cultura e cidadania brasileira.
Foto: Álvaro Herculano
“Enquanto no festival de Corumbá nós dialogamos com os países da América do Sul e debatemos a questão das fronteiras, em Bonito nos voltamos para as divisas de nosso país e a questão da nossa identidade e cidadania brasileira. Foram 10 países convidados em Corumbá e em Bonito tivemos 10 estados brasileiros, fora o MS. O FIB foi um sucesso, sem nenhuma violência e com uma programação baseada no respeito, na paz e na democracia”, afirma Athayde Nery, secretário da cultura e cidadania de MS.
O festival de Bonito contou com, por exemplo, 16 shows musicais, 18 apresentações de artes cênicas e 36 oficinas, além de palestras, seminários, debates e atividades relacionadas ao meio ambiente, turismo, gastronomia e educação. A rede hoteleira de Bonito teve os mais de seis mil leitos lotados, garantia do sucesso da programação ao atrair turistas e a população para assistir espetáculos e shows gratuitos, assim como deixar um legado para o município por meio da educação.
Além da intensa programação na Praça da Liberdade, o festival teve atividades no distrito de Águas de Miranda, no Assentamento Guaicurus e nos bairrosMarambaia e Vila Machado. No Centro de Múltiplo Uso (CMU), além das apresentações diurnas, também foram realizados shows à noite, com Marta Cel e Glória Groove, na sexta-feira, e Whisky de Segunda e Funk Como Le Gusta e Daúde, no sábado. No CMU também foi realizado o campeonato de skate.
Foto: André Patroni
CULTURA E MEIO AMBIENTE
Neste ano, o Festival de Inverno de Bonito abriu espaço para discussões importantes sobre cultura, cidadania e meio ambiente. O município bonitense é um dos principais destinos do ecoturismo mundial. Por isso, os assuntos voltados para o meio ambiente foram enfocados em exposições, palestras, seminários e ações como a realização do Mutirão de Limpeza nos Córregos Urbanos de Bonito, promovida pelo Instituto das Águas da Serra de Bodoquena. Já o presidente do Instituto Lixo Zero, o catarinense Rodrigo Sabatini, participou do festival com uma palestra voltada para a redução de dejetos e seu impacto no meio ambiente.
Foto: Aurélio Vinícius
O engenheiro civil ressaltou a necessidade de que cada pessoa cuide do próprio lixo orgânico, com técnicas de compostagem, e torne um hábito a separação do lixo reciclável, assim como a importância de encaminhá-lo para a reciclagem. “Lixo zero é uma meta que é ética, econômica, eficiente e visionária, para orientar as pessoas a mudar seus estilos de vida e práticas para emular ciclos naturais sustentáveis, onde todos os materiais descartados são projetados para se tornar recursos para outros usarem”, explicou Sabatini.
O Museu de Arte Contemporânea de Mato Grosso do Sul (Marco) promoveu a exposição “A Natureza de Ser – Genuína, Transformadora e Ameaçada” para discutir a questão do meio ambiente a partir de obras de seu acervo. Segundo a curadora e diretora do museu, Lúcia Monte Serrat, as obras de artistas como Regina Pessoa, Genésio Fernandes, Nilson Pimenta, entre outros, além de Ilton Silva –que faleceu em junho–, eram uma forma de promover o diálogo sobre a preservação e a responsabilidade do homem com a sustentabilidade.
MULHERES EM FOCO
O feminino ganhou protagonismo em áreas importantes da cultura na programação do FIB 2018. Na Casa da Memória Raida, por exemplo, a palestra de Lina Anunciação, intitulada “As Mulheres na História da Arte”, e ações como o Café Filosófico com o tema “Produção Literária Feita por Mulheres”, com participação deEvelise Couto (jornalista coordenadora do projeto Leia Mulheres); Gleycielli Nonato (escritora indígena da etnia Guató, poetisa e declamadora de Coxim); Tânia Souza (autora do livro “Estranhas Delicadezas”); Tatiane de Conto (psicóloga e atriz pesquisadora da obra de Lídia Baís) e Janet Zimmerman (escritora vencedora do Prêmio Guavira de Literatura 2017, na categoria poesia, com o livro “Pétalas Secretas”).
Foto: Altair dos Santos
Elas falaram sobre suas experiências no mundo literário, o preconceito e a necessidade de se conquistar espaço para as expressões femininas na arte. Além dessas conversas, o festival também trouxe Ângela Epifânio, ativista pelos direitos da população negra, para discutir a “Valorização da Identidade Negra”. Eladiscutiu pontos fundamentais da luta racial e questionou padrões, muitas vezes, negligenciados. A presença feminina também se fez presente com o filme “Como Nossos Pais”, de Laís Bodansky. A produção coloca uma jovem mãe como protagonista e o roteiro ressalta os conflitos de sua caminhada.
ARTES CÊNICAS PRESENTE
O FIB já é conhecido pelos shows musicais de alto nível que promove em sua programação. Em 2018, no entanto, as apresentações de artes cênicas contaram com uma plateia atenta que lotou a Praça da Liberdade. Com performances impactantes de grandes nomes do teatro e da dança brasileiros e de grupos regionais que não devem nada aos visitantes, o público foi testemunha de experiências estéticas variadas e incríveis.
Foto: Aurelio Vinícius
Do questionamento sobre as relações cada vez mais virtuais proposta pelo grupo Street Pop (MS), com o espetáculo “VIR(TU)EU”, aos ousados movimentos acrobáticos do Nós no Bambu (DF) em “Mar Sem Beira”, quem acompanhou as apresentações descobriu grandes destaques da arte brasileira, como o Balé Teatro Guaíra, de Curitiba, sua “Carmen” de Bizet brazuca, e o De Pernas pro Ar (Canos/RS), com os divertidos “Automákina” e “O Lançador de Foguetes”.
Foto: André Patroni
“Contar com esse espaço para o teatro, o circo e a dança é um fator muito positivo na realidade que estamos vivendo. É um festival que permite acesso à arte de maneira gratuita e democrática. Me surpreendi também com a dimensão e a mistura de várias áreas artísticas na programação do festival”, elogiou o ator, dramaturgo e diretor Luciano Wieser, a frente da Cia. De Pernas pro Ar, um dos grupos de teatro de rua mais respeitados do país.
INTERCÂMBIO CULTURAL
Cada vez mais tradicionais, os cortejos de abertura do Festival de Inverno de Bonito são um momento de celebração da cultura e da arte. Este ano, o grupo Camboi, com integrantes de Pernambuco e da Paraíba, trouxe uma apresentação do Cavalo Marinho, expressão da cultura popular nordestina que tem mais de 100 anos de história. Com roupas coloridas e arcos, os participantes cantaram e dançaram ao ritmo de instrumentos populares e conquistaram o público.
Foto: André Patroni
Foi o caso do campo-grandense João Trindade. “Eu sabia que ia vir este grupo de Pernambuco para a abertura. Este balanço aqui, este batuque, você não tem como fugir. Está no sangue do brasileiro, é nosso isto aí”, afirmou. Para Glício Lee, do Camboi, a condução do cortejo foi um misto de alegria e animação. “Estamos muito felizes por estar aqui, é uma honra. A gente entrou com o pé direito para dar sorte e ter mais no ano que vem”, sugeriu.
Alunos da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS) participaram de uma oficina realizada entre domingo (22) e quarta-feira (25) para aprender mais sobre o cortejo e participação da apresentação na abertura do festival, na quinta-feira (26). Além de aprender os passos, os ritmos e a história da manifestação popular, os alunos da disciplina de Danças Brasileiras confeccionaram seu figurinos e os apetrechos utilizados na festa. “Passamos o ano todo estudando danças brasileiras e este ano foi a primeira oportunidade de os alunos participarem na prática de uma dança do folclore do país”, ressaltou a professora Gabriela Salvador.
DO CLÁSSICO AO CONTEMPORÂNEO
Os shows no palco da Praça da Liberdade reuniram cerca de 40 mil pessoas em 2018 para acompanhar as apresentações de grandes nomes da música brasileira: Michel Teló, Almir Sater & Renato Teixeira, Milton Nascimento e Anavitória. A abertura ficou por conta das bandas e músicos sul-mato-grossenses Maria Alice, Ton Alves e Catarse Retrô e dos artistas bonitenses na segunda edição do show “Canta Bonito”.
Foto: Eduardo Medeiros
A noite de abertura com Michel Teló foi de grandes emoções. Entre eles, o que o músico recebeu seus pais e o que cantou o clássico “A Mato-grossense” com o pioneiro Amambai, homenageado de 2018 com o saudoso Amambaí, com quem formou uma das primeiras duplas do Estado. “É maravilhoso cantar com você, vou esperá-lo para ganharmos o The Voice”, brincou Teló. “Amambai, como tantos outros grandes cantores da nossa terra, leva nossa música com muito amor e respeito”, completou o cantor, que não teve dúvidas em abrir espaço no seu show “Bem Sertanejo” para receber o homenageado Amambai.
Foto: André Patroni
O público também viajou para a mistura de country e música de raiz de Almir Sater com o parceiro Renato Teixeira no show “AR”. O espetáculo foi um dos momentos mais emocionantes do FIB, celebrando uma amizade de mais de 30 anos entre o violeiro sul-mato-grossense e o compositor paulista. Já o a lenda Milton Nascimento, aos 75 anos, subiu ao palco no sábado para apresentar o show “Semente da Terra”, uma das atrações mais esperadas desse festival. “Foi um show apoteótico, desses que se espera nunca fechar a cortina para se continuar sonhando, se sentindo de alma lavada. Suas músicas e seus posicionamentos políticos soaram como um grito de esperança, tudo que se queria ouvir. Foi um desabafo coletivo”, escreveu o jornalista Silvio Andrade sobre o espetáculo de mais de duas horas, no qual Bituca interpretou várias de suas canções marcantes.
No domingo foi a vez do duo Anavitória. Com uma apresentação marcada por uma produção milimétrica, as cantoras do Tocantins trouxeram o público feminino empeso para a plateia e conseguiram lotar a Praça da Liberdade. O público cantou em coro hits como “Trevo (Tu)” e “Singular”, sobretudo pelos mais jovens.
MÚSICOS DE MS
Para os músicos bonitenses que integraram o show “Canta Bonito”, a apresentação no FIB foi um divisor de águas. Depois da apresentação em 2017, o grupo se assumiu como coletivo e retornou ao festival neste ano para um apresentação que reuniu um repertório de clássicos sul-mato-grossenses. “Abrir o show do Teló foi um reconhecimento ao nosso trabalho e fortalece nossa proposta de continuarmos nos aprimorando e cantando o regional. Vamos reinventar este repertório com uma nova roupagem musical”, frisou o cantor Kalu Carvalho, integrante do grupo.
A cantora Maria Alice apresentou o trabalho inédito “Sertões”, em um show que simboliza o percurso afetivo e geográfico vivido por ela. Com composições populares do Ceará e de Mato Grosso do Sul, Maria Alice afirma que apostou em um repertório para que a plateia cante junto. “São canções conhecidas e que fazem parte do nosso imagináro. Em algum momento, acredito que essas músicas se façam presentes na vida da maioria das pessoas”, argumentou.
Já o músico Ton Alves, que abriu o concerto de Milton Nascimento, fez um show à altura da responsabilidade que assumiu. Em uma miscelânea de estilos como jazz, blues, rock, soul, o guitarrista criou uma jam session no palco e conquistou a plateia. “É uma responsabilidade muito grande abrir para um dos maiores ícones da música popular brasileira. Eu sou muito fã do Milton, quando soube que abriria o show dele, eu fiquei super feliz”, comemorou.
Encerrando o festival, a banda Catarse Retrô tocou no domingo e fez um show que equilibrou ternura e protesto. “Depois três anos de existência da banda, uma apresentação em um evento do porte do Festival de Inverno de Bonito é algo que consideramos como um reconhecimento do nosso trabalho. O festival tem uma importância particular na regionalização da música, mas também de mostrar que nossa música não se restringe ao que sempre se imagina”, comenta Kezia Miranda, integrante do grupo.
ASSESSORIA FIB 2018